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terça-feira, 5 de janeiro de 2016

O Ego Religioso


    Antes de começarmos, esclareço que não se trata de um texto "anti-cristão", "pagão", "herético" ou algo similar. Trata-se apenas da análise do fanatismo religioso que atinge boa parte da população mundial. Aqui, vou me ater ao Brasil, onde a maior parte da população é cristã.
    Desde o início da colonização, o país tem adotado o cristianismo como religião majoritária a ser praticada pela população. Chegamos até a ter o Catolicismo como religião oficial, com a primeira Constituição Federal, em 1824. E o movimento que se percebe desde meados da década de 1990 é a migração de boa parte dos cristãos para o protestantismo, também conhecido como "Igreja Evangélica". É uma metonímia que engloba todas as crenças cristãs que não pertencem ao catolicismo (Assembleia de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Adventista, Bola de Neve Church etc).
    Não importam os motivos deste crescimento gigantesco que tem acontecido, pelo menos não para este texto. Falaremos disso em outra oportunidade. A análise vai se ater ao fanatismo religioso de alguns cristãos, o que inclui os católicos.

 Vaidade - o pecado primordial

     Já dizia John Milton, o diabo no filme/livro O Advogado do Diabo: "Vaidade. Definitivamente, meu pecado favorito!". É deste atributo que é construído o ser humano que conhecemos atualmente. Não há prazer maior que aquele que alimenta nosso ego. E é justamente onde podemos encontrar nossas maiores fraquezas, nosso ponto fraco. 
     Durante toda nossa vida, e isso tem aumentado nos últimos dias com o crescimento da utilização das redes sociais, tentamos provar para todo mundo que estamos bem, que somos felizes, que somos superiores, que somos melhores que todos. Seja porque saímos para beber todos os finais de semana, seja porque temos famílias maravilhosas, ou amigos perfeitos, ou simplesmente que somos lindos, possuidores de uma beleza ímpar, capaz de por si só abrir alas para as conquistas. Todos os dias uma fotografia nova no Facebook para comprovar isso. 
     Infelizmente, algumas pessoas se utilizam de sua religião para se sentirem melhores e superiores. Detentores da verdade absoluta, serão os únicos a serem salvos no dia do Juízo Final. E por seguirem a palavra de um (ou vários) salvador(es), se sentem superiores aos outros.
    Por que nos julgam?
    Jesus Cristo esteve nesta Terra para pregar o amor acima de qualquer coisa. Ele deu a outra face, ele perdoou um criminoso, ele andava com mendigos e prostitutas. Não importava o que a pessoa era ou fazia, ele não a julgava por isso.
   O que vejo são alguns fanáticos religiosos atacando com ódio algumas pessoas. Rachel Sheherazade contra os bandidos, Silas Malafaia contra os homossexuais, Marco Feliciano dizendo que os negros são descendentes amaldiçoados de Noé. Vejo muita gente repetir o discurso de ódio dessas pessoas, justificando seus pensamentos com leituras e interpretações de um livro escrito há milhares de anos.
     E o amor de Cristo? Não era isso que Jesus veio fazer na Terra? Perdoar e amar? Por que essas pessoas então não praticam estes ensinamentos? Ao contrário, julgam e odeiam. Por quê?
     Ouso concluir: vaidade. Elas precisam se sentirem melhor que as outras pessoas. Se fosse por puro conceito religioso, não praticariam um milhão de outras coisas proibidas na Bíblia (mistura de tecidos, traição do cônjuge, cobiça, inveja etc). Às vezes o simples fato de você pertencer a uma religião X e a pessoa pertencer à Y já é motivo o suficiente para ela se sentir melhor. Basta ver como tratam os praticantes das religiões africanas. 
     Vamos buscar entender melhor este conceito, mas com base na própria religião. A vaidade não teria início com o próprio texto bíblico? "Então Deus determinou: 'façamos o ser humano à nossa imagem, de acordo com a nossa semelhança'" (Gênesis, 1:26). Um ser onipotente, onisciente, onipresente, que criou tudo e todos. E nós, seres humanos, temos a imagem à semelhança Dele? Presunção de quem escreveu? Ou intenção mal interpretada?
     No primeiro capítulo de Eclesiastes, nos dez primeiros versículos, encontramos um texto cuja interpretação é bastante desanimadora, depressiva. Não importa o que aconteça, não existe um fim para o que acontece, nem nada de novo. Nada do que acontece aqui na Terra é para sempre, e o tempo continuará correndo em direção ao infinito. "Não há nada de novo debaixo do sol". Trazendo para proporções humanas em um conceito hermético (o que ocorre no macro, ocorre no micro), vivemos nossa vida sempre repetindo coisas, fazendo o mesmo de sempre, e sempre achando não ser aquilo o suficiente. Não há limite para possuir, se divertir, transar, beber. Sempre que saciamos essa nossa vontade de qualquer coisa, atingimos um intenso prazer que é procedido de uma vontade nova e maior. E se vaidade é justamente isso, essa busca intermitente por saciar pequenos e grandes prazeres — algo diretamente ligado a nosso ego —, então somos sempre muito vaidosos.
    Isso me fez lembrar também de uma história bastante conhecida, principalmente entre os católicos: Santo Antão. Figura bastante interessante, viveu por mais ou menos oitenta anos isolado em uma caverna, se alimentando do suficiente, certo de que venceria as tentações do demônio. Resistiu às comidas mais maravilhosas e mulheres mais perfeitas, negou o oásis e a fortuna oferecidas pelo mal. No fim, o demônio desistiu, certo de que havia finalmente nascido alguém que fosse mais forte do que ele. Antão, devoto do criador, de joelhos agradeceu: "Muito obrigado, meu Deus, pela força que me deste. Agora me tornei um santo!". A estas palavras, o demônio sorriu e voltou. 
   Percebam que Santo Antão resistiu a todos os pecados, menos ao da vaidade. Para poder proclamar-se santo (e isso com certeza aumentaria seu ego), ele precisou se abster de todos os outros. Mas é tão pecador como qualquer um, pois, ao resistir ao demônio, se gabou por isso. Da mesma forma que alguém se gaba de ser um marido fiel. Ou de ser um religioso que "conhece a verdade" e por isso será salvo.
     Paro para pensar e refletir por um instante: talvez por saberem explorar muito bem a vaidade das pessoas, houve um crescimento muito grande do protestantismo. Não é para tanto, as que mais possuem seguidores prometem bens materiais (carros e casas próprias), sucesso profissional e posição de destaque social. Tem aquelas que prometem até um prêmio para o pós-vida (o famoso galardão). Prêmio este que aumenta a cada fiel que a pessoa arrebatar, lembrando até esquemas como TelexFree e Monavie. 
     A verdade é que quanto mais vaidade religiosa a pessoa tiver, maior será sua intolerância para com aqueles que ela julga inferior. E quanto mais isso acontecer, maior será a intolerância dessas pessoas para com os religiosos. O certo é que cada um respeite o espaço do outro, aceitando suas diferenças, inclusive as espirituais. Senão, ser religioso não fará o menor sentido.

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